quinta-feira, 4 de outubro de 2007

A Crise do autor - O declínio da gravação na nova musica

Segundo Pierre Levy em Cyberculturas (2000) “criar uma obra, deixar um traço, gravar, não tem mais o mesmo sentido, o mesmo valor que antes do dilúvio informacional. A desvalorização das informações é uma conseqüência natural de sua inflação.A partir de então, o propósito do trabalho artístico se desloca para o acontecimento, ou seja, em direção à reorganização da paisagem de sentido que, fractalmente, em todas as escalas, habita o espaço de comunicação, as subjetividades de grupo e a memória sensível dos indivíduos. Ocorre alguma coisa na rede dos signos, assim como no tecido humano.”(p154)
Esta desvalorização da gravação parece estar cada vez mais clara quando se observa o que está acontecendo no mercado da musica. Se podemos acessar qualquer musica que quisermos, o que hoje em dia fica explicito quando acessamos Blogs onde as pessoas oferecem gratuitamente suas coleções completas para todos por nenhum dinheiro. O que esperar da motivação dos futuros artistas para criar quando percebem que suas obras serão imediatamente transformadas em mais um código binário pronto para ser copiado e manipulado eternamente?
Levy aponta para a criação de um enorme museu virtual feito de reproduções do real, o que de certa forma aconteceu quando o disco permitiu que muito mais pessoas entrassem em contato com artistas como Beetholven ou os Beatles do as que puderam estar em seus concertos, tornando-se a principal interface do publico com a obra. Diz ele: “Os gêneros da cibercultura são da ordem da performance, como a dança e o teatro, como as improvisações coletivas do jazz......”....”Seu centro de gravidade é um processo subjetivo, o que os livra de qualquer fechamento espaço-temporal”. Propõe a participação em eventos mais do que espetáculos e utiliza a metáfora do jogo para pensar essa nova arte. “No jogo como no ritual, nem autor nem gravação são importantes, mas antes o ato coletivo aqui agora.
A musica da cibercultura , para Levy chamada de musicas tecno são resultantes de um trabalho recursivo de amostragem e arranjo de musicas já existentes. As características dessa nova arte convergem em direção ao declínio de 2 elementos importantíssimos até hoje na musica: o autor e a gravação. A tese é da forma do universal sem totalidade representado pela musica pop mundial. Universal pela difusão e sem totalidade já que os estilos são múltiplos e sempre em processos de metamorfoses constantes.
O interprete foi sempre mais valorizados do que o compositor nas sociedades de cultura oral. É ele que dá uma nova vida à tradição. A invenção da escrita da musica fez com que o sistema musical ocidental seja ensinado como tal em todos os conservatórios de todo mundo. Essa tradição escrita reforça a figura do compositor que assina a obra que é pretensamente original. Essa mesma escrita nos faz identificar as obras clássicas em função de suas características históricas, mesmo que não saibamos exatamente quem é o autor.
A gravação surge então para fixar os estilos de interpretação da musica escrita. O arquivamento da atualização sonora de uma estrutura abstrata, que antes ficavam dependentes da tradição oral agora permite que tenhamos arquivados estilos populares como jazz, rock ou mesmo o samba. O estúdio passa a ser o local sagrado da musica, representando a possibilidade do registro original da peça. O produtor ganha importância já que a performance ao vivo não garante que o original possa ser reproduzido sem as técnicas de mixagem, só possíveis com os aparatos tecnológicos de grandes estúdios.
A digitalização permitiu que os estúdios estivessem acessíveis a um numero cada vez maior de pessoas, que podem produzir e divulgar suas musicas sem passar por um numero enorme de intermediários. O uso de samplers, o MIDI, o remix fazem com que as musicas possam ser produzidas a partir de amostras pré-produzidas que são re-ordenadas e re-combinadas com outras amostras criando-se sempre novas combinações de um jogo de montar infinito.
Não se trata mais de uma repetição da tradição mas de uma “transformação permanente em uma rede cíclica de colaboradores.” A gravação deixou de ser o principal fim ou referencia musical. Mais do que “acrescentar um item memorável aos arquivos da musica” o importante é criar um happening onde todos são ao mesmo tempo produtores de materia prima (na gravação), transformador, autor, interprete e ouvinte. Esse processo de inteligência coletiva musical dispensa a totalização e se mostra universal ao incluir uma transmissão por contato, um fluxo musical constante que se alimenta do “todo”aberto na musica, da mais moderna a mais arcaica”.Desta forma os modos de fechamento da musica, a gravação e a composição deixam de representar o unico objetivo dos músicos de estúdio.

Um comentário:

Unknown disse...

Fala In_Fernão

cabeçuda essa ideia hein,
o que vale mesmo agora é o "ao vivo".

Fabinho Meira
abç